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Revolta derruba o presidente boliviano

(18/10/03)


FABIANO MAISONNAVE
ENVIADO ESPECIAL A LA PAZ

Após conturbados 14 meses de mandato, quando mais de 120 pessoas morreram em violentos confrontos com manifestantes, o isolado Gonzalo Sánchez de Lozada não resistiu e teve anunciada, ontem à noite, sua renúncia ao posto de presidente da Bolívia.
Na carta lida no Congresso para comunicar a decisão, Sánchez de Lozada se mostrou preocupado com a continuidade da crise política. "Minha renúncia deveria ser suficiente para a solução dos problemas nacionais. Apesar de desejar isso fervorosamente, temo que a solução não seja tão simples."
O congressistas aceitaram a renúncia. Com isso, Carlos Mesa (sem partido), que era vice, já foi empossado como novo presidente. Ele anunciou que seu governo durará até realizar um referendo popular sobre a venda de gás e uma assembléia constituinte e se dispôs a convocar novas eleições. Pela lei, poderia ficar até 2007.
Dono de um canal de TV e autor de vários livros sobre a história boliviana, Mesa é considerado um intelectual com pouca experiência política -a primeira campanha eleitoral foi a de 2002.
Deve sofrer enorme pressão dos líderes da revolta que depôs Sánchez de Lozada. Eles querem menor participação estrangeira na exploração dos recursos naturais, mais poder à maioria indígena e o fim da repressão ao plantio de coca, financiada pelos EUA.
Para tentar iniciar o processo de pacificação do país, Mesa homenageou em seu discurso de posse os mortos na repressão aos protestos. "Minha primeira obrigação é render a mais dolorida e profunda homenagem a mulheres e homens da Bolívia que nesses dias ofereceram suas vidas à pátria, à democracia e ao futuro."
Segundo o assessor internacional da Presidência brasileira, Marco Aurélio Garcia, que está em La Paz, Sánchez de Lozada assinou a renúncia à tarde. Depois, foi de helicóptero para Santa Cruz de la Sierra. De lá, segundo um funcionário do aeroporto local, embarcou à noite, acompanhado da mulher, uma filha e quatro familiares, para Miami, nos EUA, seu maior aliado. O vôo, do Lloyd Aéreo Boliviano, faria escala em Manaus. O ex-presidente era conhecido como "Gringo", por ter vivido anos nos EUA e falar espanhol com sotaque americano.
Sob forte escolta policial, parte dos 130 deputados e 27 senadores chegaram à tarde de várias partes do país ao Congresso, em La Paz, para aguardar a carta de renúncia.
Na capital, La Paz, tomada por manifestantes, as comemorações da renúncia começaram junto com os primeiros rumores dela e se estenderam até a madrugada.
Desde sua posse, Sánchez de Lozada enfrentou três fortes ondas de protesto. Na última, que praticamente parou metade do país na última semana, ao menos 74 manifestantes foram mortos em confrontos com o Exército e a polícia.
O líder oposicionista Evo Morales, segundo colocado na eleição presidencial de 2002, estava em Cochabamba. Deputado do MAS (Movimento ao Socialismo), que tem a segunda maior bancada do Congresso, ele alegou razões de segurança. "Sánchez de Losada deveria ser julgado por crimes contra a humanidade", afirmou o líder cocaleiro, em referência às mortes ocorridas nos protestos.
A poucas quadras do Congresso, milhares de camponeses, mineiros e moradores de áreas pobres de La Paz se reuniram para esperar o anúncio da renúncia na praça de São Francisco, palco das principais manifestações contra o impopular Sánchez de Lozada.

Isolamento
O último dia no poder para o ex-presidente, cujo mandato iria até 2007, começou com o pedido para renunciar de Manfred Reyes Villa, líder da Nova Força Republicana, a terceira maior bancada.
Logo depois, foi divulgado que o então porta-voz da Presidência, Mauricio Antezana, um colaborador antigo, também havia saído.



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