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Planalto decide mandar carta ao NYT

(11/05/04)


Taciana Collet, César Felício e Raquel Landim De Brasília e São Paulo

O governo brasileiro decidiu, ontem à noite, enviar carta ao jornal New York Times (NYT), a ser entregue hoje pelo embaixador em Washington, Roberto Abdenur, que é também quem a assina, condenando a reportagem do jornalista Larry Rohter, que noticia uma suposta preocupação da sociedade brasileira com o consumo excessivo de bebida alcoólica pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O governo não quis divulgar os termos desta carta porque, segundo especialistas da diplomacia, o jornal pode se recusar a publicá-la se já tiver sido divulgada.

Segundo informou o porta-voz André Singer, tanto o ministério das Relações Exteriores, quanto a Advocacia Geral da União, estão orientados pelo presidente a conduzir as reações e tomar as "medidas cabíveis" sobre a reportagem publicada no domingo. O Itamaraty informou que, além da carta, o embaixador Abdenur irá pessoalmente à redação do NYT para uma conversa com os editores. A AGU não anunciou a medida que adotará. O assunto permanece mantido no nível oficial fora do âmbito das relações bilaterais com os Estados Unidos. A embaixadora dos EUA no Brasil, Donna Hrinak, informou ontem que as opiniões do NYT não refletem o pensamento da Casa Branca.

A repercussão do caso no Congresso foi em um único sentido, de solidariedade ao presidente, ainda que tucanos tenham considerado a nota oficial divulgada no final de semana, ambígua e mais uma prova de inabilidade ao afirmar que o presidente se comporta como a média da população brasileira.

No plenário, tanto o líder do PSDB no Senado, Arthur Virgílio, quanto o líder do PFL na Câmara, José Carlos Aleluia (BA), condenaram a reportagem. "De nossa parte, nunca haverá resvalos para ataques pessoais ao presidente da República", disse. Os líderes governistas procuraram caracterizar o caso como uma confrontação internacional Brasil/EUA. "Este indivíduo tentou desqualificar o país, dentro de um jogo de luta dos interesses internacionais", afirmou o líder do governo na Câmara, professor Luizinho (PT-SP).

Segundo um diplomata, é a primeira vez que acontece um incidente com a mídia americana envolvendo a figura do presidente da República do Brasil. Ainda durante o mandato do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, o episódio do dossiê das Ilhas Cayman repercutiu no exterior, mas, como ficou comprovado que a história não era verdadeira, o governo brasileiro não precisou tomar nenhuma posição. Fora esse caso, há ainda registro de episódios de menor repercussão como matérias distorcidas envolvendo as questões indígena e de preservação da Amazônia.

No governo Collor, houve outra questão que mereceu protestos do governo brasileiro . Uma reportagem do jornal "Sunday Times" , britânico, escrita pelo jornalista John Ryle relacionou em 1990 o então presidente com o consumo de drogas. O governo brasileiro processou o jornal, conseguiu a condenação da publicação e recebeu uma indenização em dinheiro

Numa avaliação de especialistas, a reação do governo brasileiro à reportagem do NYT foi exagerada, provavelmente denotando uma segunda intenção, a de amplificar ao máximo a agressão ao presidente para buscar uma virada de imagem do chefe do governo. Nesta análise, considera-se exagerada, também, a reportagem.

Diplomatas, especialistas em notas resultantes de negociações delicadas, consideraram também equivocada a nota divulgada no domingo pelo Palácio do Planalto em repúdio à reportagem. A nota, segundo esta avaliação, deveria ter sido mais curta e ficado restrita aos fatos. Estes especialistas em relações externas acreditam também que o governo não deveria processar o jornal - o que custaria uma fortuna nos Estados Unidos.

O ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu, chamou os brasileiros à reação. "É uma matéria grosseira. Todo brasileiro deveria repudiá-la" afirmou. No mesmo tom, o vice-presidente José Alencar classificou-a de "ignomínia" . O presidente nacional do PT, José Genoino, definiu a reportagem como uma mistura de calúnia e mau jornalismo. Em entrevista ao portal do partido, Genoino defende que o governo processe o jornal.

A reação governista ao problema mereceu reparos da oposição. Segundo o líder tucano na Câmara, Custódio Mattos (MG), mencionar em nota oficial que o presidente mantém os mesmos hábitos sociais que a média da população é uma declaração ambígua.



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