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A hora e a vez do poeta Carlos Nejar

(15/07/03)


Em boa fase, escritor gaúcho lança poesia reunida e novos romances

Odete Leitão

A prova de que a linguagem é mais importante do que os gêneros, para o poeta e acadêmico Carlos Nejar, está em sua própria obra. O autor é também romancista e ensaísta e sempre manteve com a literatura o compromisso sagrado da criação poética. Como alerta o escritor Luis Fernando Verissimo na apresentação do romance A engenhosa Letícia do Pontal, o mais recente livro de Nejar: 'Um poeta fazendo um romance é um pouco como um feiticeiro na cozinha, que usa os mesmos ingredientes e temperos e técnica de um chef comum, mas não pode evitar que o seu ensopado seja mais do que ensopado, que tenha mais significados e serventias.'

Carlos Nejar está produzindo como nunca. Além de A engenhosa Letícia do Pontal, lançou sua poesia reunida, em dois volumes - A idade da aurora e A idade da noite. Além desses, destaca-se O evangelho segundo o vento e O livro do peregrino.

A engenhosa Letícia do Pontal é um ótimo exemplo de como a poesia se mistura ao romance. O trabalho levou cerca de 16 anos para ser concluído e traz uma história de cavalaria, repleta de desafios. Uma mulher chamada Nuvem é quem decide os rumos desta fábula, em que Nejar explora sua veia quixotesca.

Menos ambicioso, mas não menos complexo, é O evangelho segundo o vento, também um trabalho digno da tal receita de 'feiticeiro' a que se refere Verissimo. Neste romance-poema, Nejar fala da reinvenção do mundo tendo o vento - alegoricamente, o espírito de Deus - como personagem principal. Há poucas indicações de espaço (Pontal de Orvalho) e algumas referências a personagens - o pai, Reinaldo, a amada Joana, um cachorro, o Viator, que se metamorfoseiam, transformando-se em várias outras coisas. O cão, por exemplo, em determinado momento vira um rio. Há naturalmente referências aos evangelistas e à vida simples dos pescadores à época de Cristo e uma série de reflexões acerca do tempo, tema constante na obra do autor.

O livro do peregrino faz parte da trilogia que ainda inclui Cartas aos loucos e Riopampa (O moinho das tribulações). O romance, igualmente recheado de poesia, fala sobre o início dos tempos num trajeto espiritual onde tudo transcende na linguagem. Os personagens novamente trazem o dom da transmutação, como o cavalo que se torna homem.

A técnica do esquecimento como recurso da memória, ligado à idéia de infinitude, está também presente neste livro. O autor confirma: 'Caminhar é desenraizar-se.' Por isso, Nejar alinhava o sentido dessa caminhada ao esquecimento, necessário para que se tenha sempre novos rumos.

O gaúcho Carlos Nejar, procurador de Justiça aposentado, foi eleito para a Academia Brasileira de Letras em 1988. Tem mais de 40 anos de produção e uma série de premiações, como o Machado de Assis, da Biblioteca Nacional.




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